terça-feira, 30 de outubro de 2012

Íntegra do Acordão, Relatório e Voto de Condenação de Gerson Biguá

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2012.0000574229

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0004744-43.2009.8.26.0642, da Comarca de Ubatuba, em que é apelante GERSON DE OLIVEIRA, é apelado MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO.

ACORDAM, em 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores AMORIM CANTUÁRIA (Presidente), MARREY UINT E CAMARGO PEREIRA.

São Paulo, 30 de outubro de 2012.

Amorim Cantuária
RELATOR
Assinatura Eletrônica

APELAÇÃO nº 0004744-43.2009.8.26.0642
3ª Câmara
Apelante: GERSON DE OLIVEIRA
Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
Comarca: UBATUBA 2ª VARA JUDICIAL

VOTO Nº 19.301
APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE  ADMINISTRATIVA. CONTRATAÇÃO DIRETA DE AUXILIAR DE SERVIÇOS GERAIS PELO PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL. AUSÊNCIA DE PRÉVIO CONCURSO PÚBLICO. SITUAÇÃO DE NECESSIDADE TEMPORÁRIA DE EXCEPCIONAL INTERESSE PÚBLICO NÃO COMPROVADA. ATO DE IMPROBIDADE TIPIFICADO. VIOLAÇÃO À NORMA TUTELADA PELO ART. 11, INCISO V, DA LEI Nº 8.429/92. INCIDÊNCIA DO DISPOSTO NO ART. 12, III. SENTENÇA CONDENATÓRIA. MANUTENÇÃO.

RECURSO DESPROVIDO.

Apelação tempestiva, manejada por GERSON DE OLIVEIRA (fls. 306/322), nos autos da ação civil pública, reportada a atos de improbidade administrativa, ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, inconformado com a r. sentença de fls. 301/303 que julgou procedente a ação para reconhecer em seu desfavor a conduta de improbidade administrativa tipificada pelo art. 11, caput, e inciso V, da Lei nº 8.429/92, condenando-o a pagar multa civil equivalente a dez vezes o valor da atual remuneração do cargo que ocupou, à suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 05 (cinco) anos, bem como à proibição de contratar com o poder público, ou receber benefícios ou incentivos fiscais, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio, pelo prazo de 03 anos.

Sustenta o apelante a ocorrência da violação aos seus direitos à ampla defesa e ao contraditório, porquanto não lhe foi dada a oportunidade de produzir prova testemunhal, nem documental superveniente. Diz ter manifestado interesse a respeito, de modo que pede a anulação da r. sentença e a retomada do processo à fase de instrução probatória. Alega a prescrição da pretensão do autor para ajuizamento da demanda, porque ao tempo da citação do apelante, já teria transcorrido mais de cinco anos. Ademais, afirma estar configurada a prescrição intercorrente. Aduz que a contratação direta de José Correia de Oliveira foi feita para atender às necessidades urgentes e de caráter emergencial, pelas quais passava o Poder Legislativo naquela ocasião, tendo em vista a saída de um funcionário.

Contrarrazões (fls. 326/332).

A Douta Procuradoria de Justiça opinou pela manutenção da sentença (fls. 336/344).

É o relatório.

Não há se falar em cerceamento de defesa por necessidade de dilação probatória com a oitiva de testemunhas ou juntada de prova documental superveniente, para demonstrar que a contratação realizada de forma direta se fazia imprescindível naquela época.

O conjunto probatório, coligido para os autos no momento em que proferida a sentença, apresentava-se suficiente para construir a convicção íntima do juiz. E, agora, em sede de apelação, também não encontro nenhuma razão para que a r. sentença seja anulada, retomando-se a instrução processual, com o propósito de se tomar o depoimento de testemunhas ou de se permitir a apresentação de novos documentos.

A prova é destinada ao magistrado para formação de sua livre convicção, e sendo suficiente a prova documental produzida no momento oportuno, não há se falar em nulidade por cerceamento de defesa, como sustentado, o que apenas tem lugar quando ocorre o indeferimento ilegal ou abusivo de realização de determinada prova, que impede a parte de produzir aquela indispensável à confirmação de fato relevante para o desfecho da causa, o que, de fato, não se verificou (CPC art. 130).

Rejeita-se, portanto, essa preliminar.

Da mesma forma, não deve ser acolhido o argumento de ocorrência da prescrição. Com muita clareza, já foi rejeitada na r. sentença essa alegação, sem que restasse qualquer dúvida acerca da sua inexistência.

Como visto, o término do mandato de Vereador Municipal de Ubatuba do apelante data de 31/12/2004, sendo que o prazo prescricional de cinco anos para o Parquet Estadual propor a ação civil pública iniciou-se em 1/1/2005. Logo, tendo a demanda sido ajuizada em 7/7/2009, evidentemente não ocorreu a prescrição, pois, como preceitua o art. 23, caput, e inciso I, da Lei nº 8.429/92, as ações destinadas a levar a efeito as sanções previstas nesta lei podem ser propostas até cinco anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de confiança

Desse modo, afasta-se a alegação de prescrição, assim como de prescrição intercorrente, já que, nesta última hipótese, como destacou o MM. Juiz de Direito, “não houve qualquer inércia durante o compasso procedimental, inclusive no que toca à fase administrativa.” (fl. 302).

A autoria dos fatos descritos na inicial não foi negada pelo apelante. Na verdade, a todo tempo alega a inexistência de dolo ou culpa de sua parte, bem como de qualquer vantagem que pudesse ter auferido, quando da contratação direta de José Correia de Oliveira, a qual fora realizada para atendimento de suposta situação emergencial pela qual passava o Poder Legislativo Municipal naquela época.

Em que pesem seus argumentos, o apelante descuidou de trazer documentos comprobatórios de suas alegações, juntamente com a notificação, como lhe autoriza o art. 17, § 7º, da Lei nº 8.429/92.

Aliás, a mesma falta de elementos aptos a provar os fatos alegados se extrai da contestação apresentada, quando, mais uma vez, teve oportunidade para demonstrar que a dispensa de processo seletivo para contratação do servidor municipal era imprescindível num contexto de necessidade temporária de atendimento de excepcional interesse público (CPC, art. 333, II).

Por outro lado, na realidade, o Presidente da Câmara Municipal de Ubatuba feriu normas constitucionais, dentre elas, a que excepciona a realização de concurso público para o fim de contratação de trabalho por prazo determinado para o serviço público (CF, art. 37, IX).

Consta do Processo TC 2227/007/03, do Tribunal de Contas do Estado, instaurado para apurar a regularidade da contratação de pessoal por tempo determinado, realizada pela Câmara Municipal de Ubatuba durante o exercício de 2002, para preenchimento do cargo de auxiliar de serviços gerais, com base na Lei Municipal nº 973/2001 (fls. 26/256): “a contratação de Auxiliar de Serviços Gerais não se reveste de características de calamidade pública ou emergência e, tampouco necessidade temporária, reforçando a patente contrariedade ao inciso IX do artigo 37 da Constituição Federal. Desta forma, a Administração nega, também, obediência à previsão do artigo 37, II da CF/88, que determina a realização de concurso público para admissão de pessoal.” (fl. 59).

Portanto, inegável o ato de improbidade praticado pelo apelante, pois indubitável a vontade consciente de violentar os princípios tutelados pelo art. 11 da Lei 8.429/92. Acresça-se, nesse ponto, que o que se exige, em termos de pena civil, é a mera voluntariedade do agente na prática dos atos contrários aos princípios da Administração Pública.

Logo, não se pode entender que o servidor público, agente político ou não, desconheça tais princípios, que são inerentes ao exercício do mandato, cargo, função ou emprego. Aliás, a Lei nº 8.429/92 deixa claro que a tipificação do ato de improbidade prescinde do dolo genérico ou específico, ao admitir a forma culposa (art. 5º).

É suficiente o dolo genérico para a integração do elemento subjetivo, sendo certo que o específico somente é exigido nas hipóteses previstas nos incisos, nos quais expressões indicam essa circunstância ("visando fim proibido", "indevidamente"). A previsão para o comportamento culposo implica que a caracterização do ato ímprobo demanda somente a verificação da voluntariedade do ato com a previsibilidade da sua ilegalidade e consequências violadoras da objetividade jurídica protegida.

Ao exame do processo legislativo, encontra-se a origem desse dispositivo na Emenda nº 30/00, apresentada no Senado e acolhida pela Comissão: "a dosagem da pena deve guardar proporção com a extensão do dano". Nota-se, pois, que o objetivo da emenda foi permitir ao Juízo dosar as penas e não aplicá-las facultativa ou alternadamente. Por consequência, foi permitido ao Juízo fixar a pena entre os limites previstos pela lei. A alternatividade na aplicação da pena deve decorrer de autorização expressa, quase sempre definida pelo uso da preposição "ou". O mesmo se dirá da faculdade de não aplicar nenhuma sanção, embora para esta a autorização deva resultar da literalidade do texto. Não se colhe no texto integral da lei qualquer orientação nesse sentido.

O parágrafo único se refere à adequação da pena tendo em vista o dano causado ou o proveito patrimonial. O certo é que existe uma figura do ilícito que prescinde do dano, motivo pelo qual é prevista a aplicação daquelas penas. A admitir-se a prevalência do entendimento lembrado, as infrações, tipificadas no artigo 11, poderiam ficar impunes, pois inexistindo dano, faltaria substrato legal para a aplicação de sanções, diante do chamado princípio da legalidade e proporcionalidade. Por consequência, a orientação predominante conduziria a um absurdo, pois implicaria a inaplicabilidade de sanções, caso o ato ilícito não tivesse produzido consequências materiais.

Assim, na espécie, foi bem aplicada a regra do art. 12, inciso III, da Lei de Improbidade, adequadamente ponderada com o preceito acolhido pelo parágrafo único, de molde a condenar o apelante a pagar multa civil equivalente a dez vezes o valor da atual remuneração do cargo que ocupou, à suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 05 (cinco) anos, bem como à proibição de contratar com o poder público, ou receber benefícios ou incentivos fiscais, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio, pelo prazo de 03 (três) anos.

Ante o exposto, NEGA-SE PROVIMENTO AO RECURSO.

DES. AMORIM CANTUÁRIA
Relator
Assinatura Eletrônica

2 comentários:

  1. Parabéns ilustríssimos Desembargadores!!!!!!
    Vamos mostrar para este ratão que a justiça existe, e que a justiça é muito maior que esse grupo de corrupto que ele faz parte. Esse bando de rato se acham intocáveis. Bom o primeiro da ninhada rodou. Só falta ir o resto do bando.;.

    ResponderExcluir
  2. sr marcos

    e o resto da quadrilha?

    ResponderExcluir